Nas Asas da Fantasia

Um dia branco

Dai-me um dia branco, um mar de beladona

Um movimento

Inteiro, unido, adormecido

Como um só momento.



Eu quero caminhar como quem dorme

Entre países sem nome que flutuam.



Imagens tão mudas

Que ao olhá-las me pareça

Que fechei os olhos.



Um dia em que se possa não saber.

 
Sophia de Mello Breyner Andresen

Antologia

Círculo de Poesia

Moraes Editores

1975



Poema do Fecho éclair


Filipe II tinha um colar de oiro

tinha um colar de oiro com pedras

rubis.

Cingia a cintura com cinto de coiro,

com fivela de oiro,

olho de perdiz.

Comia num prato

de prata lavrada

girafa trufada,

rissóis de serpente.

O copo era um gomo

que em flor desabrocha,

de cristal de rocha

do mais transparente.

Andava nas salas

forradas de Arrás,

com panos por cima,

pela frente e por trás.

Tapetes flamengos,

combates de galos,

alões e podengos,

falcões e cavalos.

Dormia na cama

de prata maciça

com dossel de lhama

de franja roliça.

Na mesa do canto

vermelho damasco

a tíbia de um santo

guardada num frasco.

Foi dono da terra,

foi senhor do mundo,

nada lhe faltava,

Filipe Segundo.

Tinha oiro e prata,

pedras nunca vistas,

safira, topázios,

rubis, ametistas.

Tinha tudo, tudo

sem peso nem conta,

bragas de veludo,

peliças de lontra.

Um homem tão grande

tem tudo o que quer.

O que ele não tinha

era um fecho éclair.



Pequeno Poema


Quando eu nasci,

ficou tudo como estava.



Nem homens cortaram veias,

nem o Sol escureceu,

nem houve Estrelas a mais...

Somente,

esquecida das dores,

a minha Mãe sorriu e agradeceu.



Quando eu nasci,

não houve nada de novo

senão eu.



As nuvens não se espantaram,

não enlouqueceu ninguém...



Pra que o dia fosse enorme,

bastava

toda a ternura que olhava

nos olhos de minha Mãe...



                                              (Sebastião da Gama)


PADRÃO



O esforço é grande e o homem é pequeno.

Eu, Diogo Cão, navegador, deixei

Este padrão ao pé do areal moreno

E para diante naveguei.

 
A alma é divina e a obra é imperfeita.

Este padrão sinala ao vento e aos céus

Que, da obra ousada, é minha a parte feita:

O por-fazer é só com Deus.



E ao imenso e possível oceano

Ensinam estas Quinas, que aqui vês,

Que o mar com fim será grego ou romano:

O mar sem fim é português.



E a cruz no alto diz que o que me há na alma

E faz a febre em mim de navegar

Só encontrará de Deus na eterna calma

O porto sempre por achar.



                                                 Fernando Pessoa




Imaginação

A imaginação é magia e é arte

que nos faz inventar, sonhar e viajar.

Com imaginação podemos ir a Marte

ou ao centro da Terra, ou ao fundo do mar.

Com imaginação nunca estamos sozinhos.

A imaginação é um voo, um lugar

onde temos amigos, onde há outros caminhos

nos quais, sem te mexeres, podes ir passear.

Inventa uma cantiga, um poema, um desenho

um arco-íris, um rio por entre malmequeres;

esse lugar é teu, sem limite ou tamanho.

A esse teu lugar, só vai quem tu quiseres.

Rosa Lobato Faria

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